E foi aí que tudo começou.
Nós ficamos três dias discutindo com os advogados um do outro. Eu me recusava a
assinar os papéis, me negava a perde-la de vez. Era tudo que eu pensava, até
que fui obrigado por mim mesmo a raciocinar um pouco.
Eu não queria vê-la mais
infeliz do que já aparentava estar durante aqueles dias. Meu advogado até
tentou me animar dizendo que quando as crianças estivessem com uma certa idade
eu poderia ficar com uma delas, porém me neguei. Eu só iria prejudicar ainda
mais a nossa vida e o nosso quase inexistente relacionamento.
Voltei para Inglaterra e eu
não saia de casa há dois dias. Até amigos tentaram fazer contato depois da
notícia da nossa oficial separação, mas ignorei todos as mensagens, e-mails e
ligações.
Por mais que eu tentasse
esquecer, ela me fazia falta. Eles me faziam falta, os choros no meio da noite
faziam falta e até mesmo acordar cansado por conta de passar a noite em claro
por causa deles também.
Aquilo tudo estava sendo uma
grande barra para mim. Eu não conseguia aguentar, perdi muitas coisas de uma só
vez. Uma besteira, tudo por minha culpa. Se eu tivesse voltado para casa em vez
de aceitar aquela proposta ridícula, estaria sorrindo à toa com os meus filhos
e minha mulher ao lado.
Don't
let me...
Don't
let me...
Don't
let me go.
'Cause
I'm tired of feeling alone
Don't
let me...
Don't
let me go.
'Cause
I'm tired of sleeping alone...
Eu cantarolava uma música
escrita por mim há tempos atrás sem parar. Com meus olhos marejados, poucas
lágrimas escapavam. Mas eu ainda não podia controlar nem conter a tristeza que
sentia.
Eu andava sem rumo por todos
os lados do meu quarto. A minha mente funcionava a milhão e várias coisas sobre
nós passavam por ela. Por mais que fizessem poucos dias, eu sentia como se
aquilo jamais fosse acabar para mim. Eu não fazia ideia de como ela estava, mas
era bem provável que fosse superar isso mais rápido que eu.
Enquanto eu ainda perambulava
pelo cômodo, meus olhos finalmente se fixaram em algo e pude sorrir um pouco. Nosso álbum de fotos...
Fui até lá e o peguei com
todo cuidado como se aquilo fosse fisicamente minhas próprias lembranças. Assim
que o abri, me sentei na cama para observar e sentir melhor. Era como se ela
estivesse comigo.
Já na metade do álbum,
percebi o início da gestação dela. Desde a descoberta, tiramos várias fotos
para jamais esquecermos daqueles momentos. Como
se fosse possível...
Haviam várias fotografias
nossas. A que mais me chamou atenção, foi aquela que ela me direcionava um
olhar apaixonado enquanto eu a acariciava sua barriga com cuidado. Me lembro
que essa foi a foto escolhida por mim para postar em uma rede social e com certeza
eu nunca a tiraria de lá.
Eu me sentia muito triste e
abalado enquanto lembrava do dia do nosso casamento. Parecia mesmo que iria
durar para sempre. O dia em que me declarei para ela quando ainda éramos
amigos, o nosso primeiro beijo, a vez em que brigamos por ciúmes bobo dela,
nossos votos, a nossa lua de mel. Tudo seria eterno para mim, mesmo que isso
nunca mais voltasse a se repetir.
Minha vida virou de ponta
cabeça depois que nos conhecemos. Mas agora que não a tenho mais, percebo que
estar de ponta cabeça era o meu lado certo.
Mas eu tinha que entender. De
uma forma ou de outra teria que superar tudo aquilo. Seguir em frente, querendo
ou não.
Dez meses
e meio depois...
Eu estava evitando lugares
que ela geralmente ia. Já bastava as fotos como lembrança, não precisava de
mais nada para colaborar na depressão.
Eu estava bem melhor do que
alguns meses atrás. Não completamente são, mas talvez conformado.
Eu queria muito ver os meus
filhos por vídeo-chat, mas ela nem se importava em entrar. Parecia até fazer de
propósito.
Como pode perceber estou a
chamando de ELA. Pode até me
chamar de imaturo, mas estou sim a evitando ao máximo.
Durante esses meses para me
distrair, eu me foquei bastante na carreira e creio que tenha funcionado muito
bem. Com alguns dias de folga, resolvi passear já que eu mais ficava trancado
destro de casa do que em qualquer outro lugar.
Eu andava pelas calçadas
calmamente e um pouco alheio de tudo. Eram muito raros os momentos em que eu
prestava atenção em alguém ou até mesmo respondia os cumprimentos que me eram
direcionados. A minha mente estava ocupada demais com a mulher que me deixou há
dez meses atrás.
Por mais que fosse muito
improvável, eu ainda tinha esperanças sobre o nosso relacionamento. Quem sabe
um dia poderíamos virar pelo menos amigos? Talvez aquilo não me fosse o
suficiente, mas para alguém que não tem nada, é mais do que um presente. Eu só
precisava ficar perto dela, era o que me importava.
Reconhecendo a rua, encontrei
uma banca. Queria estar por dentro das notícias das últimas semanas já que
ignorei qualquer coisa que não fosse meu trabalho durante esse tempo.
Enquanto eu vasculhava as
revistas, reconheci a velha senhora sentada na pequena banqueta ao meu lado.
Então a simpática chinesa ainda estava por ali!
- Bom dia, Nancy! - Assim
ouviu minha voz, ela me olhou e sorriu.
- Harry, querido! - Se
levantou com dificuldade e me abraçou. - Como anda a vida?
- Difícil, mas suportável. -
Sorri fraco. - E a senhora, como vai?
- Estou ótima! - Voltou a se
sentar. - Seus filhos cresceram, estão lindos!
Fiquei um pouco sem graça.
Tinha me esquecido que ela havia adquirido uma leve perda de memória.
- Nancy, nós nos separamos.
Eu não vejo meus filhos há quase onze meses... - Passei as mãos pelo cabelo.
- Ah, eu sei querido. - Riu e
seus olhos quase desapareceram. - (SeuNome) está linda também, pelo corpo que
tem mal parece que teve gêmeos.
A velha estava biruta, sem
dúvidas.
- Nancy, ela está no Brasil.
- Tentei arrumar uma forma simples de explicar.
- Tenho absoluta certeza que
não. - Continuou a sorrir simpaticamente. - Meus neurônios são velhos, mas
ainda funcionam bem.
Sei,
funcionam.
- Ela mora no Brasil desde
antes dos meus filhos nascerem, Nancy. - Sorri fraco. - Ela não virá para cá
tão cedo. Você deve ter a confundido com alguém.
Ela respirou fundo e apertou
os lábios como se ainda tentasse me convencer. Pensou, pensou e pensou até que
levantou o indicador mostrando que teve uma ideia.
- Me lembrei de algo! -
Sorriu novamente. Esses chineses...
- O nome das crianças eram... - Voltou a pensar e isso demorou um
bocado. - Cody e... Jessica!
Imediatamente meu coração
parou.
- Jessie. - A corrigi ainda
assustado. Ela sabia sobre as crianças, mas nem a mídia sabia sobre o nome
deles.
- Exatamente. - Se demonstrou
confiante. - Eu as vi com meus próprios olhos e isso eu posso jurar.
- Pode provar? - Talvez eu
tenha soado um pouco arrogante, mas como eu teria certeza?
- Acho que não posso provar.
- Suspirou derrotada. - Mas ela esteve aqui há alguns dias e mencionou sobre um
apartamento próximo à estação. Até me pediu para visitá-la, mas eu nem sei onde
isso fica direito e...
Parei de prestar atenção dela
e comecei a lembrar um pouco de algumas coisas.
"Precisamos
de um lugar mais aconchegante, estamos esperando duas crianças!"
"Vi
um apartamento no centro e acho que você vai gostar, é uma graça!"
"Ele
fica bem próximo a estação Queensway..."
- Bayswater, é claro! - Falei
alto. - Obrigado Nancy! - A dei um beijo no rosto e me apressei.
Se ela estava ou não ali, eu
precisava saber. Eu queria encontrá-la e ver os meus filhos. Por favor, que não seja engano, por
favor...
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